Banner - Conheça 10 hábitos e costumes da relação entre Salvador e África

Conheça 10 hábitos e costumes da relação entre Salvador e África

Posturas e práticas reafirmam ligação entre população dos dois continentes

Com a maior população de negros fora do continente africano e o histórico de formação da cidade forçado pelo contexto do tráfico negreiro, a fusão de etnias, tradições e práticas culturais formaram a identidade soteropolitana. No Brasil e na África são óbvias as semelhanças e encontros nos hábitos, língua, costumes, culinária e práticas religiosas. Desta vez, o SCA destaca dez aspectos que confirmam essa relação intrínseca.

Gastronomia

No modo de preparo, na forma de servir e, em vários casos, na nomenclatura dos pratos não há diferença entre os dois continentes. A prática da comida feita, vendida e consumida na rua é outra característica presente lá e cá. Com relação aos alimentos, a banana, o inhame, o azeite de dendê, o coco, o gengibre e o quiabo são alguns elementos de origem africana que foram incorporados à nossa alimentação. Boa parte dos pratos foi preservada por conta da relação com a religiosidade de matriz africana, por se tratar de comida ritual, como o acaçá (espécie de manjar com milho e leite de coco envolto em palha de bananeira), o ekuru (farofa de feijão-fradinho), o acarajé (bolinho feito de feijão-fradinho temperado com cebola com sal frita no azeite de dendê), o xinxim (espécie de ensopado de frango com azeite de dendê), dentre outros.

Moda

O corpo sempre foi veículo de expressão de posicionamento e leitura social. Sendo assim, a moda sempre foi um diferenciador de classes e grupos e, no caso da influência africana, o uso de cores fortes (isoladas ou em estampas), peças em desenhos geométricos, uso de miçangas (utilizadas em acessórios de beleza e em objetos de proteção, como contas de divindades do panteão africano) são referências que foram incorporadas. O tipo do tecido e a forma como é utilizado no corpo expressam autoafirmação, pertencimento e identidade de quem está vestindo a roupa.

Trançados

O cabelo, com trançados e penteados, também sempre foi símbolo de identidade. Antes do significado atual de autoafirmação e beleza, o cabelo marcava a origem, classe social, religiosidade, parentesco, poder aquisitivo, estado civil, poder, idade, etnia e outros atributos identitários. A origem remonta à Namíbia (África). Atualmente, o autocuidado e a reconstrução da autoestima são pontos importantes da arte de tramas de fios, que representam valores culturais diversos passados por gerações como representação de luta, resistência e beleza.

Festejos e espiritualidade

O soteropolitano é um povo festeiro e religioso. Como a forma de ser africana, a vivência da espiritualidade acontece no cotidiano e associado a ele. O sagrado perpassa o dia a dia de forma permanente. E isso o soteropolitano faz de forma semelhante nas festas de largo. Em torno dos ancestrais e divindades, homenagens e comemorações são feitas com comida, dança e bebida. O africano não separa o sagrado do cotidiano, mas tudo é feito de forma consciente e cada prática em seu momento específico.

Feira

A organização do comércio de alimentos, especialmente nas feiras populares, e o jeito de negociar e mercar (sempre falando alto) são mais elementos que unem o que é visto e vivenciado na capital baiana aos modos de fazer africanos. As feiras livres reúnem vários elementos culturais que representam a territorialidade de uma população. Dessa forma, o jeito de anunciar as propriedades do produto vendido na banca, as comidas de feira, o processo entre consumidor e comerciante para se chegar ao consenso no que diz respeito ao valor do produto, o pedido do “choro” ou da “quebra” são posturas que revelam a raiz africana.

Adivinhação

Consultar a ancestralidade para tomar uma decisão ou saber qual caminho seguir ou auxiliar na resolução de qualquer tipo de problema. De modo geral, o africano age assim diante da vida, e aqui não é diferente. Uma rezadeira, um sacerdote, um curioso. A consulta é feita para garantir a segurança antes de agir. Na realidade das religiões de matriz africana existe o Ifá, que consiste num sistema divinatório utilizado pelas sociedades iorubás, localizadas na Nigéria e no Benin, na África ocidental.

Religiosidade

O culto à natureza é o ponto de encontro entre as práticas religiosas no continente africano e no outro lado do oceano Atlântico. Com as forças da natureza, as divindades do panteão africano e o seu domínio no universo. A dependência, o respeito e a preocupação com a preservação do meio ambiente é comum na prática das religiões de matriz africana. Nesse contexto inclui-se a valorização do saber medicinal a partir do uso das folhas, principalmente para curar enfermidades. As folhas são usadas também para afastar más energias e atrair bons fluidos. Visão de mundo que confirma a colaboração africana.

O que se fala

De duas regiões da África subsaariana (banto e sudanesa) vieram mais de quatro milhões de africanos entre os séculos XVI e XIX para o Brasil. O quicongo, o quimbundo e o umbundo são três das 300 línguas apenas da região banto (Angola, Congo e Moçambique). Sem contar o iorubá, falado na Nigéria. Com essa realidade, a configuração do português brasileiro não tinha como não ser influenciado. Sendo assim, o português falado é resultado do contato com essa diversidade. São exemplos de vocábulos que foram inseridos: bagunça, caçula, axé, cuíca, abadá, quitanda, fubá, dendê, moleque, lengalenga, dengo, encabular, zangado, zonzo, borocoxô, biboca, cafofo, cafundó, cambada, fuçar, tribufu, xodó.

Expressão corporal

A forma de reagir diante das situações do cotidiano com traços e memórias ancestrais manifestados pelo corpo na comunidade também é um elemento que identifica a raiz, a origem cultural, e não só na desenvoltura na dança, no jogo de corpo da capoeira, mas também no momento da ladainha da capoeira, quando o mestre dá o sotaque (tipo de improviso, quando o cantador dá um recado ou aviso, conta uma história), na umbigada (geralmente utilizado como convite para entrar na dança) do samba de roda, no muxoxo, comer de mão (que pode ser praticada de forma individual que remonta à memória afetiva familiar ou em ritos com comida votiva, como no Olubajé, quando o alimento é servido na folha de mamona e comer de mão é obrigatório). O corpo “fala” sobre identidade.

Brincadeiras e jogos

O lúdico sempre esteve presente na civilização africana, na formação e desenvolvimento do indivíduo. Os ensinamentos vão desde estratégia de raciocínio a como aprender a lidar com o outro, o respeito à ancestralidade, o viver em coletividade, dentre outras práticas de origem africana que foram ressignificadas dentro da nossa cultura, da mesma maneira que os jogos de tabuleiro riscados no chão, como a mancala (jogo de tabuleiro de raciocínio lógico e estratégia), o pega-pega, o pilolo (procurar objetos escondidos), o labirinto, a amarelinha africana, entre outros.

Para saber mais: Costumes Africanos no Brasil, Manuel Querino