Dia Municipal do Afoxé: celebração do Candomblé de Rua em Salvador

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Desfiles dos Afoxés em 1983. Acervo iconográfico do Arquivo Público de Salvador. BR BA AHMS ESP.

Ao longo da história da Bahia, a cultura afro-brasileira ganhou voz e força por meio dos blocos afro e dos afoxés. Fortemente ligados às religiões de matriz africana, os afoxés — originários da Bahia e conhecidos como um verdadeiro Candomblé de Rua — transformam os espaços por onde passam, que se tornam territórios sagrados no momento em que se evocam a energia dos ancestrais e das divindades africanas.

Durante o Carnaval de Salvador, esses grupos desfilam em cortejos que celebram a fé, a cultura e a ancestralidade africana, embalados pelo som de atabaques, agogôs, xequerês, criando um ritmo vibrante e envolvente.

Afoxé Filhos de Gandhy em 1988, na Igreja de Sta Luzia. Acervo iconográfico do Arquivo Público de Salvador. BR BA AHMS ESP.

Nascidos como expressões de resistência ao racismo e de valorização das raízes africanas, os afoxés ultrapassam o contexto carnavalesco, desempenhando um papel fundamental na luta por igualdade e na afirmação da identidade baiana. O Dia Municipal do Afoxé, celebrado em 30 de novembro, é ocasião em que o Visit Salvador da Bahia destaca e homenageia essa rica trajetória.

História e curiosidades

Visita do Embaixador da Índia em 1988. Sede Filhos de Gandhy. Acervo iconográfico do Arquivo Público de Salvador. BR BA AHMS PMS.

Os primeiros registros encontrados sobre os afoxés na Bahia datam do final do século XIX, mais precisamente de 1895, quando clubes negros, que tinham uma organização carnavalesca formalizada, passaram a receber postulações e visibilidade diversas dos afoxés da época.

A Embaixada Africana foi o primeiro afoxé, desfilando no Carnaval de 1895. O grupo Pândegos de África surgiu em 1898 e, assim como a Embaixada Africana, organizava seus desfiles com vistosos carros alegóricos e ricos figurinos. O maior e mais conhecido afoxé de Salvador – Filhos de Gandhy – foi formado em 1949 por estivadores, sua origem está vinculada com a ancestralidade africana e com a religiosidade do candomblé, e o nome tem como inspiração o grande líder e pacifista indiano Mahatma Gandhi (que havia sido assassinado no ano anterior).

Segundo o Livro do Registro Especial dos Eventos e Celebrações do IPAC – Instituto do Patrimônio Artístico e Cultural da Bahia, o Afoxé é uma manifestação carnavalesca composta pelo ritmo ijexá, cânticos, indumentárias, instrumentos musicais e ritual. Esses itens conjuntamente formam o Desfile de Afoxés – cortejo de rua.

Reinauguração do Dique do Tororó em 1998. Acervo iconográfico do Arquivo Público de Salvador. BR BA AHMS PMS.

Idealizados, na sua maioria, nos terreiros de candomblé, os afoxés trazem em suas insígnias a marca registrada da força que compõem os símbolos religiosos – o oxé de Xangô, o dourado de Oxum, o padê de Exu, o branco de Oxalá.

A definição etimológica para afoxé é múltipla, primeiro porque os estudiosos que observaram seus desfiles no século XIX não deixaram registros concisos quanto à denominação do termo. A formação original do afoxé era a seguinte: arautos (músicos anunciadores), guarda branca, rei, rainha, Babalotin, estandarte do afoxé (normalmente bordado a fios de ouro), guarda de honra e charanga (músicos que tocavam atabaques, agogôs, xequerês e afoxés). Todos os integrantes vestiam trajes principescos.

Conheça alguns afoxés de Salvador

Afoxé Filhos de Gandhy
Instagram: @gandhyoficial

O Afoxé Filhos de Gandhy, fundado em 1949 por estivadores do Porto de Salvador, é hoje o maior afoxé do carnaval baiano, reunindo mais de 10 mil homens. Inspirado nos princípios de paz e não-violência de Mahatma Gandhi, o bloco mantém forte ligação com a religiosidade de matriz africana, expressa nos cânticos em iorubá e no ritmo ijexá. Suas apresentações seguem rituais sagrados, como o padê para Exu no Pelourinho. Além de atuar no Carnaval, o grupo mantém atividades comunitárias durante todo o ano e participa de importantes celebrações religiosas, como a Lavagem do Bonfim, a de Itapuã e a Festa de Iemanjá.

Afoxé Filhas de Gandhy

Afoxé Filhas de Gandhy. Foto divulgação.

Instagram: @afoxefilhasdegandhy

A Sociedade Recreativa e Cultural Afoxé Filhas de Gandhy é uma entidade filantrópica, fundada em 1979, reconhecida como Ponto de Cultura e desempenha um papel fundamental e inspirador no Carnaval da Bahia.Considerado pelas integrantes como o primeiro afoxé do Brasil formado exclusivamente por mulheres, o grupo é voltado para o empoderamento feminino e a valorização da diversidade cultural, sendo um símbolo de luta e resistência desde sua fundação. Reúne mulheres de diversos segmentos sociais e representantes de diferentes terreiros da capital baiana.

Afoxé Filhos do Congo
Instagram @filhosdocongo

O Afoxé Filhos do Congo é uma das mais importantes e longevas manifestações da cultura de matriz africana no Carnaval de Salvador, representando a força e a resistência do povo negro na Bahia. Sua história é marcada por três gerações que mantiveram viva a tradição do ijexá e a homenagem à ancestralidade banto. O ressurgimento em 1979, sob a liderança de Nadinho do Congo, consolidou o Afoxé como uma Associação Comunitária e Recreativa.

Afoxé Korin Efan
Instagram: @filhosdekorinefan

O Afoxé Filhos de Korin Efan, localizado na rua do Passo nº 26, Santo Antônio Além do Carmo, foi fundado pelo mais antigo ogã alabê de Salvador, Erenilton, o Elemaxó da Casa de Oxumarê. Mestre Erenilton, falecido em 2014, era um profundo conhecedor dos cânticos sagrados das quatro principais nações da religião dos orixás — ketu, ijexá, jêje e angola. Em 2012, recebeu da Assembleia Legislativa o título de Mestre Popular, em reconhecimento à sua importância para a tradição musical e religiosa afro-baiana. Atualmente, o afoxé é presidido por sua filha, a advogada Elisângela Silva.

Além dos vibrantes desfiles realizados durante o carnaval, o Afoxé Korin Efan promove todos os anos, em dezembro, uma programação especial em homenagem a Santa Bárbara e Yansan, celebrando um dos períodos mais simbólicos do calendário religioso e cultural da Bahia. São quatro dias de festividades, de 1º a 4 de dezembro, marcados por celebrações, encontros e manifestações que exaltam a força, a coragem e a ancestralidade.

Grêmio Comunitário Cultural Olorum Baba Mi
Instagram @olorumbabami

No final da década de 1970, um grupo de amigos resolveu criar uma agremiação no bairro da Caixa D’Água, em Salvador. O objetivo era mostrar a cultura da comunidade nos desfiles do Carnaval. Com o passar dos anos, o Grêmio Comunitário Cultural Olorum Baba Mi se fortaleceu e resiste através de ações sociais e apresentações. Saiba mais neste link.

Por Fernanda Slama
Pesquisadora e jornalista

 

Fontes usadas nesta matéria:

Publicação Desfile de Afoxés, Cadernos do IPAC – Instituto do Patrimônio Artístico e Cultural da Bahia (Ipac – Gov); (Caderno em DPF)

Desfile dos Afoxés é patrimônio cultural da Bahia IPHAN

Dia Municipal do Afoxé é celebrado na Câmara Municipal de Salvador.

Afoxés – Patrimônio Cultural. Geledés.

“Afoxé Cultura Ancestral”: projeto propõe preservação e reconhecimento neste link.

Grupos de afoxés desfilam pelo Centro Histórico de Salvador em busca de reconhecimento cultural neste link.

Afoxés: O Candomblé de Rua na Cidade do Salvador. Lista completa UFBA

Afoxé Filhos de Gandhy conta com mais de 10 mil integrantes (Terra março 2025)

Muito além do Ilê: cinco blocos afro e afoxés que você deve conhecer, por Maysa Polcri e Larissa Almeida. (Correio 24h fevereiro de 2024)

Trajes do afoxé Filhos de Gandhy refletem ancestralidade e performance em cortejos (Jornal da USP 2023)

Recortes de jornais neste link.

Rua Chile. Carnaval de Rua, em 1987. Acervo iconográfico do Arquivo Público de Salvador. BR BA AHMS ESP.